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Os olhares falam as palavras que a boca não pronuncia, talvez esse seja afinal o nosso sentido mais apurado.

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Perdidos não achados

Roubou o telemóvel à Mãe e ligou-me. Não falou, estranhei. Ficou a soluçar repetidamente até que o choro diminuísse.
Dei-lhe tempo, e, de cima das pantufas que sei que nunca larga – as da Minnie –  perguntou-me directa, sem rodeios, se não tinha medo de perder coisas.
 Fiquei inerte com a inocência de uma pergunta tão cortante mas que só escondia as lágrimas pelo peluche perdido.
Respirei mais devagar para ganhar tempo (que nunca seria suficiente) e procurei dar-lhe a resposta que não quis encontrar no colo da avó.
 É sempre tão complicado dar-lhe uma verdade que não borre com o tempo.
Mas respondi-lhe. 
Disse-lhe que não, que não tinha medo de perder quase nada e que isso não era bom - viver como se nunca tivesse nada a perder. Que temos. Sempre.
Alertei-a para isso com um português que lhe chegasse.
 Calou-se, num silêncio que não esgota perguntas.
Aceitou a resposta, contudo, não soube como lhe explicar a dualidade que existe entre não ter medo mas não gostar.
E porque me lembro que naquela idade “outro não é o mesmo”, evitei negociar-lhe a sobra de lágrimas com um peluche novo; disse-lhe antes que a levava a um sítio que ainda não tinha ido. 
De volta aos 6 anos - e ainda bem - impôs paragem obrigatória nos gelados e despediu-se com a rapidez de quem diz que já perdeu os desenhos animados no canal Panda.