"E quando a tempestade tiver passado, mal te lembrarás de ter conseguido atravessá-la (...). Nem sequer terás a certeza de (...) ter realmente chegado ao fim. Mas uma coisa é certa. Quando saíres da tempestade já não serás a mesma pessoa. Só assim as tempestades fazem sentido."
Haruki Murakami
Sim, depois da tempestade não serás a mesma pessoa.
ResponderEliminarNão ser a mesma pessoa é mudar.
Mudar é melhor.
Logo, não ser a mesma pessoa é melhor.
É por isso que eu provoco tempestades de areia.
Para arrumar a mala, de vez!
A mala.
Amá-la.
Amar(-te).
Amar(-te) é o oásis no deserto da minha alma.
Grandes são os desertos, e tudo é deserto.
Pequena é a vida mas sim! vale a pena haver vida!
Porquê?
Porque o deserto assim o exige.
A vida é o sentido do deserto.
José Pina
GRANDES SÃO OS DESERTOS, E TUDO É DESERTO.
Grandes são os desertos, e tudo é deserto.
Não são algumas toneladas de pedras ou tijolos ao alto
Que disfarçam o solo, o tal solo que é tudo.
Grandes são os desertos e as almas desertas e grandes
Desertas porque não passa por elas senão elas mesmas,
Grandes porque de ali se vê tudo, e tudo morreu.
Grandes são os desertos, minha alma!
Grandes são os desertos.
Não tirei bilhete para a vida,
Errei a porta do sentimento,
Não houve vontade ou ocasião que eu não perdesse.
Hoje não me resta, em vésperas de viagem,
Com a mala aberta esperando a arrumação adiada,
Sentado na cadeira em companhia com as camisas que não cabem,
Hoje não me resta (à parte o incômodo de estar assim sentado)
Senão saber isto:
Grandes são os desertos, e tudo é deserto.
Grande é a vida, e não vale a pena haver vida,
Arrumo melhor a mala com os olhos de pensar em arrumar
Que com arrumação das mãos factícias (e creio que digo bem)
Acendo o cigarro para adiar a viagem,
Para adiar todas as viagens.
Para adiar o universo inteiro.
Volta amanhã, realidade!
Basta por hoje, gentes!
Adia-te, presente absoluto!
Mais vale não ser que ser assim.
Comprem chocolates à criança a quem sucedi por erro,
E tirem a tabuleta porque amanhã é infinito.
Mas tenho que arrumar mala,
Tenho por força que arrumar a mala,
A mala.
Não posso levar as camisas na hipótese e a mala na razão.
Sim, toda a vida tenho tido que arrumar a mala.
Mas também, toda a vida, tenho ficado sentado sobre o canto das camisas empilhadas,
A ruminar, como um boi que não chegou a Ápis, destino.
Tenho que arrumar a mala de ser.
Tenho que existir a arrumar malas.
A cinza do cigarro cai sobre a camisa de cima do monte.
Olho para o lado, verifico que estou a dormir.
Sei só que tenho que arrumar a mala,
E que os desertos são grandes e tudo é deserto,
E qualquer parábola a respeito disto, mas dessa é que já me esqueci.
Ergo-me de repente todos os Césares.
Vou definitivamente arrumar a mala.
Arre, hei de arrumá-la e fechá-la;
Hei de vê-la levar de aqui,
Hei de existir independentemente dela.
Grandes são os desertos e tudo é deserto,
Salvo erro, naturalmente.
Pobre da alma humana com oásis só no deserto ao lado!
Mais vale arrumar a mala.
Fim.
Álvaro de Campos, in "Poemas"
Boa noite. Só agora consegui passar aqui no seu blogue para ver se havia novidades suas. Sábados de trabalho são complicados...
ResponderEliminarSim, é um bom poema. Profundo.
O meu facebook? But you know what they say: don't judge a book by it's cover... Mas tudo bem, aqui está: http://www.facebook.com/iamjustjose
Como vê o meu facebook está abandonado. O deserto invadiu-o.
E eu ando aqui, errante, por amor à mudança e a tentar evoluir.
Felizmente neste seu blogue encontrei algum conforto e, se não se importar, celebrarei amanhã o domingo colocando um poema num dos seus "posts". Só tenho de escolher em qual. Quer dar alguma sugestão?
Então e desse lado? Qual o rosto desse lado? Rostos são sempre máscaras do Ser, mais ou menos fiéis, por isso: qual a máscara desse lado?
Quer escolher uma para me mostrar, uma que a represente? Um facebook, uma imagem? Um poema? Um texto?
Até já, Mulher.
José Pina